quinta-feira, setembro 01, 2005

VIDA

O baque da cadeira contra o chão esparramou as entranhas da barata. Seus órgãos indistinguíveis se misturavam às patas traseiras e pedaços de seu abdome. Ela se remexia num desespero silencioso. Sua dor era gritante e muda.
Me surpreendi com o que tinha feito, me senti até culpado, por mais ridículo que possa parecer.
A barata ficou imóvel.
Me senti aliviado por sua morte, pelo fim de sua agonia.
Peguei um guardanapo e joguei sobre seu cadáver, por mais ridículo, ainda, que isso possa parecer.
Quando voltei meu olhar de novo ao chão, pouco depois, descobri que a tal criatura não estava nada morta. Sem metade do corpo a barata se virou e com as duas patas da frente e uma outra pata quebrada ela se afastava de sua metade morta. Ia de encontro ao tempo, dilacerada, rumo ao escuro, insistindo na vida.